Fecho o livro, já estamos quase
chegando. Apressada, corro à porta e espero alguns instantes. Ela se abre e eu
sei que finalmente estou quase de volta ao lar! Olhos espertos (como de pomba,
já diz meu avô), certifico-me de que posso atravessar. Os dedinhos já apertados
na sapatilha pedem descanso, a mochila nas costas, em um ombro só, agora parece
um pouco mais pesada, e a calça jeans já prende minha circulação. A passos
rápidos, apresso-me na direção, não sem contemplar a beleza do pôr do sol qual
feito uma criança agradecida a Deus pelo belo espetáculo.
Assim, lá se vão duas quadras.
Quando viro a esquina, a rua vazia, e então a árvore na calçada de casa parece
ter crescido aos meus olhos. Como um corredor que aspira à placa de chegada,
corro em sua direção com o coração farto de alegria. Os pés agora deslizam com
mais facilidade na rua onde recentemente os trabalhadores da prefeitura taparam
os buracos. Diferentemente, a calçada de casa já está em pedaços, como coração
mal amado, por cauda da raiz da frondosa árvore, e eu acho até charmoso.
Quando levanto os olhos, já posso
ver nossa velha casinha de madeira azul da cor do céu e, ansiosa por ir ao seu
encontro, coloco as pequenas mão no frio da grade de ferro, abrindo o caminho.
Tiro os sapatos, e nos pequenos metros que nos separam, vou sentindo o
cheirinho de verde, e a maciez da grama – como quem pisa em uma nuvem. De
repente meus ouvidos escutam um barulho bem familiar, e posso ver correndo na
minha direção o cachorro que late com alegria pela minha volta e traz entre os dentes seu brinquedo.
Após uns minutos de afagos,
abraços e brincadeiras, amenizada a saudade, prossigo a caminhada nos poucos
metros que nos separam. Sua madeira desgastada guarda tanta vida, tanta
história! Pois recordando o passado sei que meus avós te construíram com as
próprias mãos e suor e, depois de muitos anos, foram meus tios, meus pais,
amigos e até um pouquinho eu quem te demos cara nova, de cor azul e pisos
brancos, como o vestido novo de uma dama, tecido à mão com carinho. Tudo isso
pra combinar com o jardim de flores e as plantas que te cercam. Com a terra
molhada que inebria o ar quando chove. Com a terra fértil onde tudo que se
planta se colhe.
Talvez sejamos inspirados por ela
que nesses anos todos resolvemos plantar tanto amor dentro de ti. Por isso
então que mais do que construir paredes, edificamos o lar dentro dos corações
da nossa família. Só isso explica porque ao entrar meu coração bate mais forte
e eu finalmente posso me sentir em paz num lugar tranquilo.
Até que uma pergunta me vem à
mente, recordando da placa de vende-se que há pouco pairava nas grades do seu
portão. Como? Nenhum dinheiro seria capaz de trazer à tona tantos sentimentos
bons. E, provavelmente quem te comprasse te daria destino certo. Faria cair por
terra nossos sonhos, e te derrubaria ao chão para construir uma casa mais
moderna em seu lugar.
De que importa? Quem sabe você
seja um pouco como nós, humanos, pelos quais a agente edifica o amor na alma e
mesmo quando a morte nos assole, ele estará vivo em nós. Permaneceriam as
recordações dos bons momentos aqui vividos.
Porque nós somos tais quais casas,
construídas com suor esforço e muito trabalho, proviemos de um material divino. Ficamos
velhos e um dia já não servirá mais este grosso envoltório que nos compõe. Mas
ainda sinto que, nesse dia, no dia em que a matéria não importe mais tanto
assim, seremos mais ricos. Porque não são as máquinas, nem as pessoas, nem o
tempo ou a vida que destruirão tudo que somos e fizemos de bom, pois eles já estarão pra
sempre edificados em nós. Nosso corpo é nossa casa, mas nossa alma é nosso lar!