Ser mulher não é fácil mesmo! Mal saio de um dilema e já me encontro em outro. Sempre que alguém me pergunta se minha filha vai nascer de parto natural ou de cesárea, já preparo mil justificativas na minha cabeça antes de responder: CESÁREA!
Em uma sociedade tão machista e patriarcal, existem inúmeras regras implícitas, que não precisam ser ditas, porque simplesmente sabemos. Até porque, demorou uma vida inteira pra introjetar em nós tantos preconceitos, que chegamos a duvidar que eles não estavam ali desde sempre, sendo tão nossos.
Ninguém precisou me falar (ao menos não clara e diretamente), mas eu sempre entendi o recado. Pra ser uma mãe, de verdade, você precisa ter seu bebê de parto normal.
Mas esse nunca foi um desejo meu. Passar por toda essa dor e sofrimento, quando há outras opções disponíveis, não é algo que me deixe empolgada. Simplesmente penso não ser necessário.
Nessa hora, os defensores do parto natural vão dizer: mas é mais saudável para o bebê e para a mãe, a recuperação é mais rápida, há uma conexão maior entre a mãe e o filho neste momento.
E eu simplesmente respondo: talvez seja, e que bom que há essa opção, para quem se sentir confortável com a escolha.
Acho incrível se é uma decisão da mulher parir dessa forma, e respeito. Só não é uma escolha minha, e eu também espero ser respeitada por isso, ao invés de me sentir diminuída como mulher e como mãe, por preferir a cesárea.
E foi exatamente assim que me senti por algum tempo. Julgada, criticada. Sobretudo porque nos últimos anos, tenho tentado ser mais consciente do meu lugar e do meu papel no mundo, procurando ser mais ecológica, deixando de comer carne por alguns meses, optando por utilizar fraldas de pano modernas na minha filha.
Até por estar nessa vibe mais “naturalista”, me incomodava o fato de que, de forma alguma, eu cogito ter um parto dito natural. Mas, como num estalo, numa noite dessas, percebi que essa decisão tem muito mais a ver comigo.
Nunca acreditei que o sofrimento seja um mal necessário. Ao contrário, penso que nascemos para ser feliz, descobrir, aprender, da melhor forma possível. E essa visão, muitas vezes, contraria os fortes preceitos religiosos arraigados na nossa sociedade, na qual o sofrimento é supervalorizado como forma de espiar os pecados, e onde, mesmo após 2021 anos, os cristãos ainda não retiraram Jesus Cristo da cruz.
Nesse contexto, quando uma mulher engravida, obviamente, é porque ela fez sexo. E o sexo ainda é um tabu nessa sociedade hipócrita. Assim, essa mulher “pecadora” não é digna de tornar-se mãe, um ser tão sublime e angelical, que tudo faz por seus filhos.
Então, a forma de “purificar” a mulher grávida, tirar dela a culpa, a fim de que ela ocupe essa nova posição, é fazê-la sofrer, sentir uma dor imensa, literalmente rasgar-se ao meio por seu rebento. Somente depois disso é que ela será digna de admiração e respeito.
Mas o homem, que também fez sexo, nenhuma punição sofre. Pelo contrário, é supervalorizado por ser tão viril e fértil.
Acontece que eu não me sinto pecadora por ter feito sexo, nem acho que mereça qualquer punição por isso, ou que precise me submeter a um procedimento extremamente doloroso, porque as outras pessoas pensam que é o certo a fazer.
Não amo menos minha filha por optar pela cesárea. Não sou menos mãe ou menos mulher por isso. Quem vai parir sou eu, é o meu corpo, eu tenho o direito de decidir como desejo que seja nosso parto, e quero ser respeitada por isso.