sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Enxergar além

Eu sempre me emociono vendo filme de terror. Mas raramente sinto medo. É que penso que os espíritos que aterrorizam as pessoas o fazem porque estão sofrendo, e um dia vão perceber seus erros e agir melhor. Isso me faz lembrar que é preciso enxergar além. Os olhos veem pouco.

Quando vejo alguém pobre, como eu, logo penso que a pessoa deveria fazer algo para mudar de vida. Aí respiro fundo e lembro que essa pessoa vai além do dinheiro: é alegre, engraçado, trabalhador, honesto e educado - e isso independe da conta bancária.

Quando vejo uma obesa, penso que ela, assim como eu, como muito para esquecer a tristeza que carrega, ou substituí-la por um prazer momentâneo. Então recobro minha consciência e lembro que sequer a conheço, e talvez ela seja mais feliz que eu.

Quando vejo uma negra, logo me vem à cabeça a vida de militância dessa mulher, que não descansa nem ao menos um dia, pois simplesmente viver para ela é um ato de resistência. Então lembro que sou mulher e preta, só não me reconhecendo tanto nessa luta porque a pele um pouco mais clara me deixa num limbo - nem branca, nem preta - protetor e acovardante. No fundo, admiro a coragem dessa mulher.

Assim, até mesmo cego poderia ver que meu olhar sobre o outro é simplesmente um reflexo do que eu sou - e não aceito. Não é sobre o outro, é sobre mim e como lido com tudo isso. Diz respeito a autoestima, autoaceitação, amor, e aprendizado diário.

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